Home Torcedoras Aira Bonfim: Jogadoras e trabalhadores: como reconhecer o assédio moral?

Aira Bonfim: Jogadoras e trabalhadores: como reconhecer o assédio moral?

Uma denúncia sem muitos precedentes no meio do futebol tem chamado a atenção da modalidade feminina nas últimas semanas. O caso se trata da exposição de situações de assédio moral no ambiente de clube, ou seja, de trabalho

Aira Bonfim
Colunista do Torcedores.com.

O caso do SPFC

Uma jogadora da equipe do SPFC (que não terá o seu nome revelado aqui) processou o clube na Justiça do Trabalho, alegando episódios de assédio moral pelo técnico e descaso do clube ao longo de 2019.

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O técnico em questão é Lucas Piccinato e a alegação, que ainda tramita na justiça, nos alerta para um tema bem pouco explorado no futebol: assédios morais entre os trabalhadores da bola.

O desejo de jogar bola é tanto, entre meninos e meninas, que infelizmente a minha surpresa refere-se não ao surgimento de suspeitas de casos de assédio, mas da formalização de uma tardia denúncia pública.

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Cabe a observação que além da paixão pelo esporte, a composição etária de jogadores e jogadoras em início de carreira é feita por pessoas muitos jovens, sujeitas a naturalizarem relações de trabalho abusivas, tóxicas e até criminosas.

Ainda hoje sinto falta de uma “disciplina de vida” em que deveríamos TODXS aprender sobre nossos direitos e deveres no contexto do trabalho. Tanto nós, trabalhadores, mas principalmente, os chefes, coordenadores e diretores.

No caso dos atletas, o caso ganha circunstâncias ainda mais alarmantes quando reconhecemos que são seus corpos a sua principal fonte de renda e trabalho, e a “vida útil” de uma carreira no alto rendimento é muito curta. Ou seja, os estragos de um cotidiano com assediadores pode ser irreparável.

Prazos, pressões e broncas são uma coisa… Ofensas, humilhações, constrangimentos e punição corporal são outras e tem nome: assédio moral!

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Cenas da Maratona de Boston de 1967 quando a corredora Katrine V. Switzer era prejudicada de finalizar o trajeto da prova.

A diversidade no Assédio

Vale ressaltar que o assédio moral atinge ambos os sexos e todas as raças e etnias tanto no Brasil, como em qualquer lugar do mundo.

Entretanto, a diversidade étnica e racial, assim como a equidade entre os gêneros nem sempre são respeitadas nas relações de trabalho, determinando impactos diferenciados no acesso ao emprego, na permanência e ascensão na carreira.

Em outras palavras, esses públicos por vezes se veem como alvos recorrentes de assédios dessa natureza.

Mas afinal, o que é ASSÉDIO MORAL?

Caracteriza-se como assédio moral todo comportamento abusivo (gesto, palavra e atitude) que ameaça, por sua repetição, a integridade física ou psíquica de uma pessoa, degradando o ambiente de trabalho.

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Nunca viveu isso? Você é uma pessoa de sorte e uma exceção na nossa classe…

Geralmente as relações hierárquicas de poderes no ambiente do trabalho extravasam esses limites e contribuem com o silêncio, o medo e a dificuldade de apontamento desses comportamentos dentro de uma empresa.

Mas como acontece exatamente o ASSÉDIO MORAL?

As vezes é uma sutileza. Por vezes são situações (agressões) consideradas pouco graves quando vistas isoladamente, mas a constância e a repetição caracterizam o assédio moral como agressão gravíssima e danosa à saúde do trabalhador.

Críticas constantes (já viu esse??)… Indiretas quase diretas de tanta constância….

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Como se identifica o ASSÉDIO MORAL no ambiente do trabalho?

Ser impedido de realizar o trabalho por sobrecarga, não recebimento de tarefas ou até mesmo missões impossíveis quando não se é o Tom Cruise (prazos ou dificuldades bizarras) são exemplos que caracterizam o assédio.

O constrangimento público e a vergonha tornam ainda mais fácil o acúmulo de críticas ao trabalhador assediado. iniciando um  comportamento cíclico e desolador.

Quem já viu um trabalhador exemplar ser prejudicado ao ser transferido para uma área/setor como resultado de uma punição? Pois é…

Quem ASSEDIA?

Qualquer pessoa pode ser um assediador. Todavia, observa-se com recorrência o abuso de autoridade e poder entre as hierarquias como um fator relevante nesses episódios. Chefes ou superiores ocupam a maioria dos casos.

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Mas o assédio, em menor escala, pode surgir de um rompimento de “alianças de relacionamento” no trabalho, com ciúmes deflagrados, com formas de isolamento (física ou emocionalmente) onde outros colegas de trabalho também podem reproduzir a mesma atitude de um assediador.

Reconheça uma AGRESSÃO!

Já ouviu essas frases abaixo?

“Você é difícil mesmo! Não consegue nem fazer isso!”

“Você é mole, frouxo… Se você não tem capacidade para trabalhar… Então porque não fica em casa?”

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“Porque você não desiste!?”

“Todo dia você tem um problema, uma desculpinha, um mimimi…”.

E se falar já não foi o suficiente, vale observar os indicadores dos gestos como mímicas pejorativas, “zueiras”, “bullyings” e “imitações” no contexto do trabalho.

Mas como o ASSÉDIO MORAL afeta especificamente as mulheres?

Já ouviu alguém ter dificuldades ou ser impedida quando grávida de comparecer a uma consulta médicas durante o expediente?

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Ou lá no exame admissional, o médico interferindo no planejamento familiar da contratada ao questionar se ela usa métodos contraceptivos ou sondando se ela tem pretensões de engravidar…

E quando grávida, a empresa/chefe desconsidera recomendações médicas na distribuição de tarefas. Insalubridade? Quem nunca ouviu sobre isso?

E talvez o mais comum: desconsiderar sumariamente a opinião técnica da mulher em sua área de conhecimento! Um clássico tão famoso como um derby…

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Mas porque combater o ASSÉDIO?

O assédio moral faz mal, muito mal. Provoca baixa autoestima, desânimo, baixa qualidade de trabalho, nervosismo, ansiedade, tristeza, desentendimentos na família causados pela agressividade ou apatia.

De maneira mais persistente o corpo também sente: distúrbios físicos e emocionais duradouros, crises de choro, dores generalizadas, insônia ou sonolência, sensação de inutilidade, diminuição da libido, depressão, dores de cabeça, tonturas, falta ou excesso de apetite e falta de ar.

Quantas pessoas foram prejudicadas por não sentirem vontade de ir ao trabalho e faltaram “sem justificativa”?

Não ficam por fora consequências ainda mais graves como tentativas de suicídio, alcoolismo, depressão profunda, crises de pânico e até obesidade mórbida.

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Agora que já sabe o que é, o que fazer com a detecção de ASSÉDIO MORAL?

Se você é vítima de assédio no trabalho, crie coragem e denuncie;

Se você é testemunha de cena(s) de assédio no trabalho, ofereça apoio à vítima, inclusive na coleta das provas. A solidariedade de colegas, familiares e amigos é uma arma potente para gerar melhores condições de enfrentar o agressor.

Apresente a situação a outros trabalhadores e solicite mobilização;

Para que haja apuração é fundamental a coleta de provas: gravações de conversas e ou de imagens são exemplos de provas;

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Fique atento e atenta!

Embora não exista ainda legislação específica em nível federal, quem assedia pode ser responsabilizado nas esferas administrativa (infração disciplinar) ou trabalhista (arts. 482 e 483 da CLT), civil (danos morais e materiais) e criminal (dependendo do caso, os atos de violência poderão caracterizar crime de lesão corporal, crimes contra a honra, crime de racismo, ou outros).

Por ambientes de trabalho com menos assédio!