Home Futebol Ex-roupeiro da seleção vendeu par de chuteiras de Ronaldo para não passar fome e luta contra um câncer

Ex-roupeiro da seleção vendeu par de chuteiras de Ronaldo para não passar fome e luta contra um câncer

Barreto trabalhou na CBF por 25 anos e foi até dono de restaurante, mas uma demissão inesperada depois da Copa do Mundo de 2014 virou a vida dele de cabeça para baixo

Daniel Servidio
Jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo. 22 anos. Acredita que o mundo é feito de histórias.
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Rogelson Barreto tinha 31 anos quando pisou pela primeira vez na sede da CBF, em 1989. Ex-funcionário de uma construtora no Rio de Janeiro, tinha acabado de se casar e, com dívidas, queria um emprego em que pudesse receber um salário maior. Por meio de um conhecido, foi apresentado a Ricardo Teixeira, então presidente da entidade, e conseguiu uma vaga como roupeiro. Começou na seleção sub-20, passou pelo futebol feminino e chegou ao time masculino principal.

De lá até 2014 foram seis Copas do Mundo. A primeira, em 1994, rendeu a ele o apelido de pé-quente. No segundo título, em 2002, os pés dele, que continuavam quentes, serviram para amaciar as chuteiras do artilheiro Ronaldo. A premiação sempre era dividida igualmente entre jogadores e comissão técnica. Ainda houve 1998, 2006, 2010 e 2014.

Barretinho, como era chamado quando convivia com Ronaldo, Romário, Roberto Carlos, Kaká, Neymar e muitos outros, ganhou o dinheiro que queria quando entrou na CBF, comprou apartamento na Barra da Tijuca, foi dono de restaurante em Maricá, deu entrevistas e até dançou no Caldeirão do Huck, da Globo.

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Queridinho dos boleiros, dedicou mais de 25 anos da vida a preparar material para os treinos, organizar uniformes, calibrar bolas, dar e ouvir conselhos. Não ouviu, no entanto, a principal recomendação de Américo Faria, a quem considera um pai: guardar dinheiro.

A dica do ex-dirigente não fazia sentido até a Copa do Mundo de 2014. O roteiro estava traçado, afinal: o Brasil venceria o torneio, Barreto comemoraria muito, como em 94 e 2002, e, com o dinheiro da premiação, compraria o terreno do restaurante, que até então era alugado. Os sete gols da Alemanha, no entanto, foram golpes duros na vida do roupeiro.

Após a eliminação, toda a comissão técnica, incluindo Barreto, foi demitida. Ele não engoliu o fato e guardou na lembrança o que considera uma traição de José Maria Marin, ex-presidente da CBF, ao médico José Luiz Runco.

Sem ter feito um pé-de-meia, vieram as dívidas, a busca frustrada por um novo emprego e os choros constantes pelos cantos. O restaurante faliu, e ele precisou vender medalhas, carro e o par de chuteiras usado por Ronaldo na final da Copa de 2002 para não deixar a família passar fome. Em 2019, um câncer e uma síndrome de Fournier terminaram de virar a vida de cabeça para baixo.

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Hoje Barreto vive com a esposa, três filhos e um neto em uma casa de 2.800 m² em Maricá – que pagou à vista na época em que trabalhava na seleção brasileira. Considera sorte e diz que, se não fosse esse teto, estaria morando de favor na casa de parentes. Tem piscina, um campo de society, mas o dinheiro da aposentadoria é pouco para luz, gás e comida – além dos custos de remédios e a necessidade de três cirurgias, que o SUS não cobre, para tratar das doenças diagnosticadas no ano passado. Precisa, muitas vezes, pedir ajuda aos familiares para comida e as contas de casa.

À espera do tratamento, atrapalhado pela pandemia do novo coronavírus, Barreto aguarda também o desenrolar de um processo trabalhista movido contra a CBF em 2015. O ex-roupeiro cobra horas extras e remunerações que vão além do contrato de trabalho. Em entrevista ao Torcedores, ele conta a trajetória com orgulho, mas, além do arrependimento por não ter guardado dinheiro, mostra frustração pela falta de reconhecimento na hora da demissão. “Será que alguém vai me ajudar?”, questiona.


Do sonho de ser jogador a roupeiro

Quando adolescente, Barreto tentou ser jogador de futebol. Foi aprovado em um teste no Flamengo, mas, por estar acima do peso, não ficou. Era meia-direita, e, segundo ele próprio, bom de bola. Começou a trabalhar aos 14 anos, mas ainda frequentava as peladas.

A carreira de jogador não deu certo, e Barreto foi trabalhar na construtora Queiroz Galvão, no Rio de Janeiro. Com 31 anos e já casado, o salário que ganhava era pouco. Mas uma ideia do próprio pai colocou o futebol de volta na vida dele: “Seu padrinho está na CBF. Por que não vai ao quartel falar com ele?”. E foi.

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O “padrinho”, no caso, era o Coronel Calomino, com quem Barreto tinha servido no exército em 1978 e que tinha cargo na CBF. O então funcionário de construtora procurou o coronel na Escola de Educação Física do Exército da Urca. Foi recomendado pelo porteiro a ir até a sede da CBF, que lá encontraria Calomino. De ônibus e com a esperança de uma vida melhor, chegou à Rua da Alfândega, antiga sede da entidade, e foi recebido com entusiasmo.

Pediu uma vaga ao “padrinho”, que não hesitou: “Você é o filho preto que eu não tive. Está empregado”. Barreto foi levado até Ricardo Teixeira, e depois Calomino o apresentou a Paulo Dutra, então supervisor da seleção sub-20, onde tudo começou. “Quero que ele vá para a próxima viagem e aprenda o serviço”, disse o Coronel a Dutra. E Barreto aprendeu.


A primeira Copa: pé-quente e bicho certo


O roupeiro foi chamado para a seleção masculina principal depois da Copa do Mundo de 1990. O Brasil havia sido eliminado na oitavas de final, e toda comissão técnica de Sebastião Lazaroni foi demitida. O supervisor Américo Faria, então, cumpriu uma promessa feita a Barreto: assim que houvesse uma oportunidade, ele subiria para o time principal.

Na Copa do Mundo de 1994, disputada nos Estados Unidos, a dupla Bebeto e Romário se destacava dentro de campo. No vestiário, no entanto, quem deixava tudo em ordem era outra dupla: Rogelson Barreto e Antônio de Assis – os dois roupeiros -, em entrosamento que durou por mais de 20 anos.

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Se a torcida brasileira ficava tensa com os jogos sofridos na competição, Barreto tinha quem lhe acalmasse: Romário. Antes de cada jogo, o Baixinho dizia ainda no vestiário: “Barretinho, pode gastar, que hoje o bicho é certo”. Bicho, na gíria boleira, é o dinheiro recebido após cada vitória.

“A Copa de 94 foi uma glória. A coisa mais linda que aconteceu na minha vida. O Romário era incrível. Quando acabavam os jogos, ele me falava: ‘Aí, peixe, não te falei que era bicho certo?’”, conta Barreto, que, ali, campeão mundial na primeira Copa que participou, ganhou o apelido de pé-quente.


Previsão do Fenômeno e reencontro com Roberto Carlos


A Copa do Mundo de 2002 foi a terceira do roupeiro – e a que ele teve as melhores “atuações”. Ronaldo foi o artilheiro daquele torneio, com oito gols. Se as chuteiras calçadas pelo Fenômeno se adequavam perfeitamente aos pés e lhe permitiam voar em campo, era porque Barreto fazia o trabalho duro.

Antes dos jogos e treinos, o roupeiro calçava as chuteiras e dava voltas no campo – tudo para que elas amaciassem e não incomodassem os pés de Ronaldo. Toda dedicação e o prazer com que cumpria a missão deram resultado.

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Um dia antes da final da Copa, em que o Brasil venceu a Alemanha por 2 a 0, Barreto ouviu um pedido especial e uma espécie de previsão: “Barretinho, amacia essa chuteira, que amanhã vou fazer gol com ela”, disse o Fenômeno, que fez os dois gols que deram o pentacampeonato ao Brasil, e, de quebra, presenteou o roupeiro com o par de chuteiras usado na partida.

E não foi apenas Ronaldo que previu situações. Na mesma Copa, Barreto viu ser realizada uma previsão que havia feito a Roberto Carlos anos antes, quando ambos estavam juntos na seleção sub-20. O jovem lateral-esquerdo pediu que o roupeiro lhe desse uma camisa, com a qual presentearia o pai. “Quero levar uma para ele, porque não sei se volto [para a seleção]”, disse o jogador. O “vidente” Barreto, então, respondeu: “Você vai voltar, vai jogar na seleção principal e ainda vai ser milionário”.


O auge da carreira

A rotina de um roupeiro não se resume apenas a dias de jogos. Quando não havia competições, Barreto trabalhava no Departamento de Seleções, na sede da CBF, das 13h às 19h, de segunda a sexta. Ajudava a separar ficha de jogadores, verificar passaportes, separar pastas e conferir documentos.

O dia a dia mudava, no entanto, quando o Brasil ia entrar em campo. Os roupeiros costumam se apresentar na Granja Comary, a casa da seleção, dois dias antes da concentração para as partidas. Em dias de jogos, chegam duas horas antes e saem duas horas depois. Precisam cuidar da roupa dos jogadores, separar o material, mandar para a lavanderia e arrumar tudo nos armários dos atletas. A rotina é ainda mais intensa em competições, como a Copa do Mundo.

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Barreto gostava. Amava o clima do vestiário, que diz ser sensacional. Era de lá que ele via a maioria dos jogos, por uma televisão, à disposição caso alguém precisasse de uma chuteira diferente ou uma camisa nova. Quando não havia TV, o desespero era grande. Subia as escadas para enxergar o campo cada vez que ouvia gritos da torcida.

Adorava conviver com os jogadores, conta ter histórias com vários deles, e chama os técnicos com quem trabalhou de “paizões”. O salário, segundo ele, era bom. Tinha carteira assinada e, quando saiu da CBF, estava ganhando R$ 3.500 por mês. As premiações, que tinham valores altos, eram sempre divididas de forma igual entre atletas e comissão técnica.

Com o dinheiro que recebia, Barreto comprou um apartamento na Barra da Tijuca. Morou no Recreio dos Bandeirantes, bairro nobre da zona oeste do Rio de Janeiro. Em Maricá, região metropolitana do estado fluminense, pagou à vista uma casa de 2.800 m², com piscina e quadra society, e também abriu um restaurante no mesmo município.

Querido pelos boleiros, virou “celebridade”. Apareceu na mídia, deu entrevistas e, em 2013, participou de um quadro do Caldeirão do Huck, da Globo. Foi homenageado com a reforma de um carro que tinha – um Gol que foi pintado com as cores da seleção brasileira. Para isso, dançou o “Passinho do volante”, famoso à época como “Ah, lelek”, junto dos filhos, em plena TV aberta. E lembra do dia com orgulho.

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O roupeiro, assim como muitos jogadores, não soube administrar tudo isso. Gastava o que ganhava com festas, almoços e viagens para a família. Estava sempre pagando. Ao mesmo tempo, o restaurante não dava muito certo – tinha gastos com funcionários e o aluguel que pagava era caro. Nunca teve, porém, preocupação em guardar dinheiro para o futuro.


“A CBF não é para sempre”

Barreto incentivava e dava conselhos para jovens jogadores, mas, ao mesmo tempo, não seguia as dicas de Américo Faria, quem o levou para a seleção principal. “Está guardando dinheiro? A CBF não é para sempre. Guarde”, dizia o supervisor a Barreto, que não entendia o sentido daquela frase.

“Américo Faria sempre foi um pai para mim”, conta o roupeiro, com a voz embargada. “Sempre que pedi um favor, ele nunca me disse ‘não’. Me tratava com carinho, dava conselhos”, continua. O maior arrependimento de Barreto é justamente esse: não ter ouvido os sábios conselhos de Faria.

“Se eu fosse por ele, estaria bem. Dava para ter guardado dinheiro, porque ganhei muito. Era para estar cheio de imóveis, não estaria na situação que estou passando, mas a gente não ouve, e, depois, se arrepende”, diz.

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Américo Faria estava certo


Os pedidos do supervisor Américo Faria para que Barreto guardasse dinheiro fizeram sentido anos depois – mais precisamente em 2014. O trabalho na CBF realmente não era para sempre, e o roupeiro sentiu isso da forma mais doída possível.

Barreto pela primeira vez pensava em fazer um pé-de-meia. Às vésperas da Copa do Mundo disputada no Brasil, tinha certeza que a seleção seria hexacampeã. O dinheiro da premiação seria usado por ele para adquirir o terreno do restaurante que mantinha em Maricá, que até então era alugado.

A derrota por 7 a 1 para a Alemanha na semifinal mudou os planos. “Foi inexplicável, porque entramos com tudo para ganhar. Trabalhamos demais, ninguém queria perder. Foi um desespero muito grande no vestiário, todos muito tristes, chorando muito”, conta Barreto. “Achava que seríamos campeões, com certeza. Aquilo foi uma coisa que nunca vi. Quando ia ver se era gol nosso, era gol da Alemanha”, completa.

Depois da eliminação, toda comissão técnica foi demitida. Barreto, pela primeira vez desde 1989, estava fora da seleção brasileira. “O pessoal de São Paulo, José Maria Marin e Marco Polo Del Nero, que já estavam no comando da CBF, aproveitaram para demitir a gente. Mandaram todo mundo passar no Departamento Pessoal para assinar a demissão, e disseram que não precisavam mais dos nossos serviços”, conta.

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“Eu trabalhei em várias categorias, fui campeão em todas. Poderiam me deixar ficar na sub-20. Não tiveram reconhecimento, não foram pessoas dignas. Eu sou um pai de família, me dediquei a vida toda, não tinha horário para dormir nem para acordar. Já eles (Marin e Del Nero), um está preso, e o outro, banido do futebol”, desabafa. Em 2017, José Maria Marin, que estava detido desde 2015, foi considerado culpado por crimes como organização criminosa, fraude bancária e lavagem de dinheiro. No início de abril deste ano, ele foi libertado pela Justiça dos Estados Unidos por conta de problemas de saúde e o risco da pandemia do novo coronavírus. Marco Polo Del Nero foi banido do futebol pela Fifa em 2018. A entidade o afastou por ter sido considerado culpado em casos de suborno e corrupção, além de conflitos de interesse e violação das regras gerais de conduta do Código de Ética.

Barreto lamenta, também, o que considerou uma traição de Marín com integrantes da comissão técnica. “Antes da partida contra a Alemanha, ele foi ao vestiário dar boa sorte e deu um beijo no rosto do [José Luiz] Runco”, conta. Runco era, até então, médico da seleção brasileira. “Como é que você dá um beijo no rosto e, quando acaba a partida, manda embora? Isso não existe. Que ser humano é esse?”, completa.


Pós-demissão difícil

Barreto demorou a engolir a demissão. Depois de 25 anos, não sabia fazer outra coisa que não fosse ser roupeiro. Poucos dias depois de ser dispensado, deu uma entrevista ao Estadão em que disse estar sem dormir direito, sonhando com o trabalho e acordando assustado. A ansiedade, na época, virou uma dor no estômago, e ele até precisou ir ao hospital. Não queria nem mesmo assinar a rescisão, pois tinha esperança de que, com o retorno de Dunga ao cargo de treinador, seria chamado de volta. Não rolou.

O roupeiro chegou a pedir emprego no Flamengo, time do coração. “Me falaram: ‘vem aqui, vai ali…’. Uma hora cansa. Não sou criança. Ia de Maricá ao Ninho do Urubu para me mandarem aguardar”, conta. Barreto, então, conseguiu fazer alguns trabalhos no Boavista – um time de Saquarema, no Rio de Janeiro -, indicado pelo “pai” América Faria. Os serviços, no entanto, não eram de maneira fixa, e ele sempre era dispensado ao fim de um campeonato.

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Sem receber, contando apenas com uma aposentadoria que considera pequena, as dívidas continuaram a chegar. Com a falta de dinheiro para pagar os funcionários e o aluguel do restaurante, precisou fechar o estabelecimento. Também conta ter vendido o carro reformado no Lata Velha, quadro do Caldeirão do Huck, pelo fato de os filhos terem medo de sofrer represálias após a eliminação na Copa do Mundo de 2014.

O que mais doeu, segundo Barreto, foi precisar vender os objetos conquistadas e os presentes recebidos durante o tempo em que trabalhou na CBF. Foram vendidas, inclusive, medalhas e as chuteiras que Ronaldo usou na Copa de 2002. “Fui ficando duro e vendendo. Não posso passar fome, e nem deixar minha família passar também. Sofri muito, mas tinha de vender. Como vou ficar sem luz, sem gás e sem comida”, diz. “Corri atrás [de emprego] para caramba. As contas não esperam. Se tivesse arrumado emprego logo, ainda estava com tudo para mostrar”, lamenta.

Da época de glória, Barreto guardou uma camisa dada por Zagallo, que homenageia o ex-treinador e ex-jogador por 250 jogos pela seleção brasileira. Dos imóveis, ficou com uma boa casa em Maricá. “Foi a maior sorte que eu tive [ter comprado a casa na época em que era roupeiro]. Se não compro, eu estaria morto, estaria morando de favor na casa de parente. Estou no maior sufoco, às vezes preciso pedir ajuda para a família com comida, ajuda para pagar a conta de luz”, desabafa.


Descoberta de um câncer

A busca por um emprego foi interrompida em 2019. Barreto foi diagnosticado com câncer de reto. Teve fístula intestinal, e desenvolveu a síndrome de Fournier – uma infecção rara e grave. Passou 50 dias internado e teve alta no dia 22 de dezembro. Foram três cirurgias.

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O filho chegou a criar uma vaquinha online para arrecadar dinheiro e custear as despesas. O valor total do tratamento, segundo as contas da família, gira em torno de R$ 150 mil. A ajuda da internet não chegou ao valor esperado – em novembro, estava com apenas R$ 4 mil -, mas Barreto contou com a ajuda de ex-jogadores da seleção brasileira, como Cafu, Edmílson, Bebeto e Branco, e conseguiu ser transferido de hospital.

Agora, aguarda o início do tratamento por quimioterapia, que será feito por meio do Sistema Único de Saúde. A pandemia do novo coronavírus, porém, atrasou os planos. “Quero começar a fazer, mas preciso esperar. Estou rezando para a pandemia passar, alguém descobrir algum remédio… Estou sofrendo por causa disso”, diz. Ainda serão necessárias algumas cirurgias que não são feitas pelo SUS. A família busca ajuda financeira para o tratamento e o dinheiro gasto com remédios e fraldas geriátricas.


Processo trabalhista e falta de reconhecimento

Nas contas do roupeiro, um processo movido contra a CBF em 2015, bem antes da descoberta do câncer, pode ajudar a resolver a parte financeira. Ele cobra horas extras e remunerações que vão além do contrato de trabalho. Barreto, que teve como testemunha o ex-companheiro de profissão Antônio de Assis, ganhou a causa em primeira instância. A CBF recorreu, venceu a segunda instância, e ambos aguardam, agora, o desenrolar do processo no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília.

O valor que Barreto pode receber gira em torno de R$ 20 mil, mas o advogado do roupeiro, Nilton Nunes, acredita que as cifras podem ser bem maiores. Ele também diz que, com a pandemia do novo coronavírus, é possível que CBF e Barreto cheguem a uma conciliação. Procurada pelo Torcedores, a entidade disse que não comenta processos em andamento.

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A maior mágoa de Barreto com a CBF é, segundo ele, a falta de reconhecimento. Acha que merecia ser mais valorizado pelas quase três décadas de serviços prestados. “Eles poderiam me ajudar. Talvez não ajudem por causa do processo, mas não podem misturar as coisas. E os anos que eu trabalhei?”, questiona. A trajetória é vista, porém, com bons olhos. “Eu sinto orgulho. Mas também fico nervoso, queria estar lá ainda. Tenho muita saudade. Às vezes começo a chorar em casa, pelos cantos, para os garotos não verem. São recordações muito boas”, conta.

O roupeiro tem tido a oportunidade de rever, no período da quarentena, jogos antigos e especiais. A Globo reprisou, nas últimas semanas, as finais das Copas do Mundo de 2002 e 1994 e das Copas das Confederações de 2005 e 2013 – todas conquistadas por Barreto. “Eu assisti às partidas, fico feliz de ver. Sempre apareço ali com material na mão, chuteira, bola… É bom demais. Me sinto parte da história”, completa.


“Será que os jogadores vão ler?”

Barreto viveu a rotina da seleção brasileira por volta de 25 anos. “Por ser um cara trabalhador e simpático, todo mundo me acolheu. Trabalhava sério, o pessoal gostava de mim”, diz, com confiança. “Eu era feliz, sou louco por futebol. Quando a ficha caiu que fui demitido, eu fiquei louco. Sempre gostei, não tinha horário pra trabalhar. Nunca falava ‘depois eu faço’, fazia toda hora. Parreira dizia que eu era muito rápido, Runco me chamava de monstro na rouparia”, completa.

A história dele, de altos e baixos, é parecida com a de muitos jogadores – mas, de dentro do vestiário, nunca chegou ao estrelato possibilitado aos grandes atletas.

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Durante o período de contato com Torcedores, fez várias perguntas com o intuito de ser reconhecido e poder ser ajudado. “A matéria vai sair em qual veículo?”. “Está ficando boa?”. “Você acha que a imprensa inteira vai tomar conhecimento da minha história?”. “Viu as entrevistas que dei quando eu era roupeiro?”. “Será que os jogadores vão ler?”. “Como as pessoas vão poder me ajudar?”, questionava.

Depois de anos organizando uniformes, Barreto agora luta para organizar a própria vida. Para isso, pede ajuda e conta com a própria história: “O futebol foi o que sempre tive”.


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