Antes de mais nada, é preciso deixar bem claro que é impossível desejar o crescimento do futebol feminino no Brasil quando a CBF trata as competições que organiza como uma “obrigação” ou apenas para “inglês ver”. É inadmissível ver arbitragens tão ruins como estamos vendo nas partidas da Supercopa Feminina. É o gol absurdamente mal anulado de Monalisa e uma série de marcações confusas durante o jogo disputado nesta quarta-feira (9). No entanto, nem mesmo isso consegue esconder o fato de que o Flamengo ainda busca se encontrar na temporada. A segunda partida do escrete de Luis Andrade na temporada teve bons momentos, mas acabou marcada pela falta de entrosamento e os problemas crônicos nas finalizações a gol falaram muito mais alto. Melhor para o Grêmio que teve na goleira Lorena a grande heroína da tarde no Estádio Luso-Brasileiro.
ESTAMOS NA FINAL! Flamengo (3) 1×1( 4) #Grêmio
Em uma partida muito disputada, buscamos o empate e levamos a decisão para os pênaltis. Nas batidas, as gurias foram com força e precisão em cada cobrança. Nas defesas, a estrela da Lorena brilhou mais uma vez.
🇪🇪 #GuriasGremistas pic.twitter.com/yXs5hVVodI— Grêmio FBPA (@Gremio) February 9, 2022
Este que escreve já havia deixado bem claro que a vitória sobre a ESMAC no último domingo (6) indicava sim um caminho para Luis Andrade, mas que ainda era preciso dar tempo e ter paciência com o time do Flamengo. Tudo por conta do elenco novo e do trabalho que está apenas nos seus primeiros passos. Implementar conceitos, organizar e coordenar os movimentos (ofensivos e defensivos) e fazer uma equipe jogar “de memória” não é fácil! E por mais que o time tenha sim qualidade técnica (com Duda, Darlene, Maria Alves, Gisseli e companhia), a equipe ainda precisa de tempo para ganhar forma e consistência.
Situação diferente do Grêmio. Mesmo com os reforços que chegaram no clube, o time manteve a base e tem os conceitos de Patrícia Gusmão bem compreendidos. Não se fala aqui de qualidade, mas de entendimento e execução de uma proposta sólida de jogo. O Flamengo iniciou o jogo utilizando uma das suas principais armas: o lançamento em profundidade para seu quarteto ofensivo. Maria Alves, Leidiani e Darlene se movimentavam de modo a buscar o espaço às costas das zagueiras e laterais gremistas e Duda se posicionava um pouco mais recuada (quase alinhada a Cris) distribuindo lançamentos e passes na intermediária.

Duda recuava, Maria Alves e Leidiani abriam o campo e Darlene atacava o espaço. O Flamengo tentou ocupar o campo de ataque com muita movimentação. Imagens: Reprodução / SPORTV / GE
Cida abriu o placar logo aos sete minutos, mas Jéssica Soares empatou para o Grêmio em falha coletiva do sistema defensivo do Flamengo aos 19 minutos da primeira etapa. E é interessante notar que o gol do Tricolor Gaúcho desarrumou o escrete rubro-negro. E a impressão que fica é a de que algumas jogadoras ainda confundem intensidade com correria e não conseguiam fazer ocupação de espaços da maneira mais adequada. Não foi por acaso que o time de Patrícia Gusmão conseguiu criar boas chances a partir dessa desorganização defensiva do Flamengo. Mesmo tendo criado mais chances, o meio-campo pouco controlava o jogo e o escrete comandado por Luis Andrade concentrava as jogadas nos pés de Duda e Darlene. E com as linhas mais altas, o Fla tinha muitas dificuldades para conter o ataque do Grêmio. Principalmente quando Luany e Dani Ortolan aceleravam.

A recomposição defensiva ruim era um dos principais reflexos da desorganização do Flamengo. Do outro lado, o Grêmio ameaçava com bolas longas o ataque. Imagens: Reprodução / SPORTV / GE
É verdade que o time do Flamengo foi muito superior ao seu adversário no segundo tempo. No entanto, essa superioridade só não se transformou em gols por conta da grande atuação da goleira Lorena (que se recuperou da falha no gol de Cida) e da falta de pontaria das jogadoras rubro-negras. Leidiane, Duda, Darlene e companhia encontravam espaços generosos na intermediária e faziam a bola circular com muita velocidade pela intermediária. Faltava o capricho na finalização a gol e calma para entender qual era a melhor decisão a ser tomada. Principalmente Maria Alves. A camisa 9 do Mengão encontrava muito espaço para atacar pelo lado direito de ataque (às costas de Jéssica Soares), mas desperdiçou ótimas chances de balançar as redes por pura afobação. É esse entendimento que precisa ser melhor trabalhado por Luis Andrade.

Maria Alves encontrava espaço para chegar na área gremista, mas pecava demais nas tomadas de decisão. Ela e quase todo o sistema ofensivo do Flamengo. Imagens: Reprodução / SPORTV / GE
A decisão por penalidades acabou premiando a atuação de cinema da goleira Lorena e puniu a falta de pontaria das jogadoras do Flamengo. O Grêmio se garante na final da Supercopa Feminina por ter sido mais eficiente e mais decisivo quando necessário. Por mais que o time de Luis Andrade tenha qualidade individual muito maior do que o Tricolor Gaúcho, é necessário compreender que o momento é de adaptação e de entendimento de conceitos entre jogadoras e comissão técnica. E isso se reflete na maneira como o time ataca e como se defende. Até mesmo o Grêmio, que já tem um certo tempo com Patrícia Gusmão, precisa desse mesmo tempo para que a equipe assimile aquilo que sua treinadora deseja. E torneio de “tiro curto” como a Supercopa Feminina acabam premiando mais aqueles que aproveitam melhor as oportunidades que aparecem pela frente. Exatamente como o Grêmio fez.
A expectativa e o “hype” em cima do time do Flamengo são compreensíveis. O investimento foi alto e a entrada de um clube com vastos recursos financeiros no cenário do futebol feminino. Mas as coisas não funcionam num passe de mágica no velho e rude esporte bretão. É preciso dar tempo ao tempo. E entender esse processo todo e colocá-lo é a grande missão de Luis Andrade, sua comissão técnica e o elenco rubro-negro. Corinthians, Ferroviária e outras equipes entenderam essa necessidade. E com o Flamengo não será diferente. Mesmo com o elenco mais estrelado e a “grife” trazida do futebol masculino.

