Home Futebol Título da Recopa Sul-Americana é mais uma resposta direta para quem critica o trabalho de Abel Ferreira no Palmeiras; confira a análise

Título da Recopa Sul-Americana é mais uma resposta direta para quem critica o trabalho de Abel Ferreira no Palmeiras; confira a análise

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa as escolhas do treinador português na vitória sobre o Athletico Paranaense de Alberto Valentim

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

É bem possível que eu, você e todos aqueles que amam o velho e rude esporte bretão só vamos ter um mínimo de noção dos feitos de Abel Ferreira na história do Palmeiras apenas daqui a alguns anos. Este que escreve afirma isso não somente pela conquista inédita da Recopa Sul-Americana, mas por todo o conjunto da obra. A vitória sobre o Athletico Paranaense foi marcada pelo lema tão repetido pelo treinador português nesses últimos meses: “cabeça fria e coração quente”. Movimentação para bagunçar as linhas do time comandado por Alberto Valentim, concentração para entender os momentos certos de acelerar ou cadenciar o jogo e muita intensidade em cada transição realizada na partida desta quarta-feira (2). O Palmeiras levanta mais uma taça e Abel Ferreira entra definitivamente para a história do clube com mais uma taça. A quarta desde sua chegada ao Brasil.

PUBLICIDADE

É verdade que o treinador português foi alvo constante de críticas mais pesadas por conta de seu estilo mais pragmático e objetivo e por conta de seu temperamento mais explosivo à beira do gramado. Para desgosto destes, Abel Ferreira entendeu que não existe resposta melhor para quem ainda insiste em diminuir seu trabalho do que vitórias e títulos. Como o da Recopa Sul-Americana. E vale lembrar também que a quase sempre infrutífera e desgastante discussão sobre o que é “futebol bonito” e o que é “futebol de resultados” acaba esquecendo desses elementos importantíssimos. A história pode até reservar um lugar para quem “joga bonito”. Mas aqueles que levantam taças sempre estão lá.

PUBLICIDADE

Abel Ferreira chegou ao seu quarto título pelo Palmeiras (duas Libertadores, uma Copa do Brasil e uma Recopa Sul-Americana). Está atrás de Vanderlei Luxemburgo, Osvaldo Brandão e Luiz Felipe Scolari na lista dos maiores campeões da história do clube. E quando falamos apenas de conquistas internacionais, o português é o primeiro colocado com três conquistas. Desde a sua chegada ao Verdão (no final de 2020), precisou trabalhar com o que tinha em mãos. Abel Ferreira foi adaptando seus conceitos às características dos jogadores e conseguiu extrair um desempenho notável de todos eles. Destaque para Raphael Veiga, Marcos Rocha, Danilo, Rony, Gustavo Scarpa, Dudu, Zé Rafael e muitos outros que passaram por lá.

[DUGOUT dugout_id=”eyJrZXkiOiJ0M3pIS0pySiIsInAiOiJ0b3JjZWRvcmVzIiwicGwiOiIifQ==”]

A vitória em cima do Athletico Paranaense nos trouxe um belíssimo resumo daquilo que Abel Ferreira pensa sobre futebol. Intensidade alta nas transições, concentração máxima em cada lance e muita movimentação para abrir espaços na defesa adversária. Ainda sem um “camisa 9” de confiança, o treinador português apostou numa formação mais próxima de um 4-3-3 com a entrada de Gabriel Verón no lado esquerdo de ataque com uma pequena variação para um 4-2-4 quando Raphael Veiga pisava na área do Furacão. Tudo para bloquear as linhas de passe do 4-4-2 de Alberto Valentim. Sem ter como sair do seu campo e vencer a pressão do seu adversário, os zagueiros e volantes do Athletico Paranaense se viam forçados a apelar para as bolas longas na direção de Terans e Pablo sem muito sucesso. Faltava velocidade e mais concentração para superar um Palmeiras altamente intenso.

Athletico Paranaense vs Palmeiras - Football tactics and formations

Formação inicial das duas equipes. O Palmeiras se movimentava bastante na frente enquanto o Athletico Paranaense tinha dificuldades para sair do seu campo.

É interessante notar aqui a dinâmica colocada por Abel Ferreira na partida desta quarta-feira (2). Mesmo sem um atacante de referência para jogar entre os zagueiros, Rony (em tese o centroavante do Palmeiras) saía da área a todo momento e abria espaços para que Dudu, Gabriel Verón, Danilo e Piquerez (que jogou com mais liberdade para aparecer no ataque do que Marcos Rocha) pudessem atacar o espaço às costas da última linha de defesa do Athletico Paranaense. E sempre que o escrete comandado por Alberto Valentim tentava fechar as linhas de passe na frente da área, Raphael Veiga aparecia como um “ponta de lança” e descobria os companheiros dentro da área com passes precisos e quase sempre decisivos.

PUBLICIDADE

Essa intensidade e essa sincronia de movimentos foi o grande diferencial do Palmeiras na vitória sobre o Athletico Paranaense. Sempre que Raphael Veiga pegava a bola, todos os outros companheiros de equipe sabiam o que deveria ser feito. Ao mesmo tempo, sempre que Dudu puxava a marcação para dentro, Rony aparecia pela direita, Gabriel Verón atacava o espaço às costas de Khellven e Danilo aproveitava os cochilos de Léo Cittadini e Pablo na recomposição. Aliás, as últimas partidas do Palmeiras nos mostram que o camisa 28 se transformou numa das grandes armas ofensivas da equipe alviverde. É mais uma prova de que Abel Ferreira soube potencializar o talento de todos os jogadores que tem à disposição.

Raphael Veiga recebe na entrada da área e vê Danilo, Dudu, Rony e Gabriel Verón atacando o espaço às costas da última linha do Athletico Paranaense. A sincronia de movimentos é uma das marcas mais fortes do Palmeiras de Abel Ferreira. Foto: Reprodução / YouTube / CONMEBOL Libertadores

Só que faltava ao Palmeiras o capricho no último passe para furar o eficiente bloqueio defensivo do Furacão. Não foi por acaso que as melhores chances da equipe de Abel Ferreira surgiram de chutes de média e longa distância. A entrada de Wesley no lugar de Gabriel Verón visava renovar o fôlego do ataque palmeirense e o time continuou pressionando bastante a saída de bola do Athletico Paranaense e empurrando seu adversário para trás. O alívio veio aos cinco minutos da segunda etapa, com Zé Rafael vencendo o goleiro Santos em belíssima cobrança de falta que lembrou alguns dos grandes batedores da história do clube. Justo a bola parada, um dos pontos mais trabalhados e treinados por Abel Ferreira desde que chegou ao Palmeiras. E mesmo com a desvantagem no placar, o escrete de Alberto Valentim manteve sua estratégia mais pragmática de esperar seu forte adversário no seu campo e sair em velocidade.

Na prática, a melhor chance do Athletico Paranaense em toda a partida surgiu de uma cabeçada de Erick que Weverton não conseguiu encaixar. O Palmeiras seguia mandando no jogo, com a posse da bola e levando muito perigo ao gol de Santos. Abel Ferreira mandou Jailson, Atuesta e Mayke para o jogo nos lugares de Zé Rafael, Dudu e Rapahel Veiga para segurar o resultado e manter a pegada do time no campo de ataque. E o gol do título (marcado aos 43 minutos do segundo tempo) surgiu justamente dessa pressão pós-perda tão defendida pelo treinador português. Abner Vinícius erra o passe no meio-campo, Atuesta rouba a bola, vence a dividida com Pedro Henrique e vai até a linha de fundo. O camisa 20 espera o momento certo para fazer o cruzamento para o meio da área e encontra Danilo livre bem próximo da marca do pênalti. O chute de esquerda saiu rasteiro e sem chances para Santos.

PUBLICIDADE

O gol de Danilo nasceu da forte marcação que o Palmeiras fazia na saída de bola do Athletico Paranaense. Atuesta (mais ao centro) interceptou passe de Abner para Erick e iniciou o contra-ataque mortal. Mais um ponto para Abel Ferreira. Foto: Reprodução / YouTube / CONMEBOL Libertadores

O título da Recopa Sul-Americana não deixa de ser mais uma resposta clara e direta para todos os críticos do trabalho de Abel Ferreira e sua comissão técnica. As críticas (muitas vezes desproporcionais) acabam sendo feitas muito mais na base do “achismo” e da má vontade com um treinador que teve que se reinventar diante do contexto que encontrou aqui no Brasil. O calendário insano, os gramados ruins e a falta de contratações à altura do clube. A confiança que passa aos seus jogadores e a maneira como pensa cada jogo da sua equipe merece sim mais reconhecimento por parte da imprensa esportiva e de todos os amantes do velho e rude esporte bretão. Não se trata de colocar o Palmeiras no grupo dos times que “jogam feio” ou que “jogam bonito”. Mas de entender o tamanho do feito de uma equipe que vem quebrando recordes e levantando taças importantes nos últimos dois anos.

Conforme mencionado lá no primeiro parágrafo, eu e você só vamos compreender o tamanho das realizações de Abel Ferreira na história do Palmeiras (e talvez até na história do futebol brasileiro) apenas daqui a alguns anos. Ou talvez somente quando ele deixar o clube. O que é certo é que o lema “cabeça fria e coração quente” já faz parte do imaginário de um torcedor que vem se acostumando a levantar títulos. E o grande “culpado” por isso é o treinador português. E isso merece sim aplausos de todos nós.