Home Futebol O incrível legado de Diego Armando Maradona, o “D10S” mais humano que o mundo do futebol já conheceu

O incrível legado de Diego Armando Maradona, o “D10S” mais humano que o mundo do futebol já conheceu

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira destaca as principais equipes de um dos maiores jogadores de todos os tempos

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.
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É bem possível que todo aquele que se considera apaixonado pelo futebol esteja bem bem triste por conta do falecimento de um dos mais geniais jogadores de todos os tempos. Talvez o “D10S” mais humano que já existiu nesse mundo. O maior “enganche” da história. Poucos chegaram perto da sua genialidade e “divindade”. E poucos foram tão polêmicos e autênticos como ele. Talvez nenhum outro atleta tenha personificado o povo de um país tão bem como Diego Armando Maradona. Amava o velho e rude esporte bretão como seus admiradores o amavam com a bola nos pés. “Dieguito” foi daqueles gênios que só surgem de tempos em tempos. Não é por acaso que o mundo inteiro chora a sua partida para o andar de cima. Aqui na coluna PAPO TÁTICO, vamos relembrar alguns dos grandes momentos de Maradona ao longo de mais de vinte anos de uma trajetória impressionantemente divina e humana ao mesmo tempo.

Dono de um futebol tão intenso quanto sua vida, Maradona surgiu para o mundo em 1976, quando estreou nos profissionais do Argentinos Juniors. Tinha apenas 16 anos de idade. Sua habilidade com a perna esquerda (e seu vasto repertório de lançamentos, passes, dribles curtos, chutes certeiros de curta e longa distância, cobranças de falta e escanteios) fez com que o jovem “Dieguito” recebesse a sua primeira convocação para a Seleção Argentina no ano seguinte. Não foi por acaso que muitos criticaram César Menotti quando este não o levou para a Copa do Mundo de 1978. Na temporada seguinte, Maradona pôde provar seu valor no Campeonato Mundial Sub-20 (disputado no Japão), quando atuou com a sua famosa camisa 10 no 4-3-3 preferido de Menotti ao lado de nomes como o atacante Ramón Díaz. Foi o melhor jogador da competição disparado e teve grande atuação na final contra a União Soviética.

Argentina Sub-20 1979 - Football tactics and formations

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Maradona jogava com liberdade para circular por todo o campo no 4-3-3 de César Menotti na Argentina campeã mundial sub-20 em 1979. Junto com o atacante Ramón Díaz (atual treinador do Botafogo), “El D10S” destruiu adversários e ainda foi eleito o melhor jogador da competição.

No mesmo ano, Maradona foi o artilheiro do Campeonato Argentino e do Campeonato Metropolitano (torneio que reunia os clubes da Grande Buenos Aires) e ainda seria eleito o melhor jogador da América do Sul, fatos que se repetiriam no ano seguinte (e isso tudo tendo levado o Argentinos Juniors ao vice-campeonato nacional, melhor resultado da equipe até aquele momento). Em 1981, “Dieguito” acertaria a sua transferência para o Boca Juniors (seu time do coração) e levaria o clube xeneize ao título do Campeonato Metropolitano naquela mesma temporada (depois de um jejum de cinco anos sem títulos) formando uma belíssima dupla com o já experiente Miguel Ángel Brindisi e levando as defesas adversárias à loucura. Principalmente o River Plate, grande rival do Boca Juniors. Em 1982, Maradona seria convocado para a Copa do Mundo da Espanha e negociado com o Barcelona numa transação recorde para a época.

A Albiceleste (ainda comandada por César Menotti) era apontada como uma das grandes favoritas ao título do Mundial de 1982. No entanto, Maradona não conseguiu fazer a diferença num time que reunia alguns membros da geração envelhecida de 1978 (como Passarella, Ardiles e Tarantini) e alguns jogadores campeões sub-20 com ele em 1979. E para piorar, Kempes (grande nome da Copa do Mundo da Argentina), não se afinou com “Dieguito” na Seleção Argentina que ainda jogava no velho 4-3-3 de Menotti. O próprio diria tempos depois: “Esquecemos que, para ganhar uma Copa, é preciso jogar. Não jogamos. Estávamos mal preparados fisicamente em 1982“. A partida contra a Seleção Brasileira de Zico, Sócrates e Falcão ficaria marcada (negativamente) para Maradona com a expulsão depois de agredir o volante Batista. “Fiz o que pude. Não perdi sozinho. Nunca venci sozinho. Mas fui quem mais perdeu“.

Argentina 1982 - Football tactics and formations

A Seleção Argentina não conseguiu apresentar um bom futebol na Copa do Mundo de 1982 mesmo com a presença de Maradona e outros nomes campeões mundiais sub-20 em 1979. “Dieguito” não se acertou com Kempes no ataque e o escrete comandado por César Menotti saiu da competição com duas vitórias e três derrotas.

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Mesmo assim, Maradona marcou duas vezes naquela Copa do Mundo. Acabaria permanecendo na Espanha após o Mundial para defender as cores do Barcelona, onde foi recebido como um deus (ou seria um “D10S”?) pela torcida blaugrana. No entanto, os problemas extracampo que acompanhariam “Dieguito” para sempre apareceriam na Catalunha. Contraiu hepatite e ficou afastado dos gramados por três meses. No entanto, na temporada seguinte, finalmente os títulos apareceriam. Maradona faria dois gols nos dois jogos da final da Copa de la Liga de 1982/83 e teria atuação destacada na decisão da tradicional Copa do Rey na mesma temporada (ambas decididas contra o Real Madrid e comandado por César Menotti). A segunda temporada no Barcelona começaria mal: fraturou o tornozelo num jogo contra o Athletic Bilbao após uma entrada desleal de Andoni Goikoetxea. Ficaria mais de três meses afastado por conta da lesão.

Depois de se recuperar, Maradona veria o mesmo Athletic Bilbao vencer o Campeonato Espanhol (um ponto à frente do Barcelona) e a Copa do Rey. Aliás, esse jogo (vencido pela equipe basca por 1 a 0) entraria para a história por conta da confusão generalizada que “Dieguito” causou ao final da partida (você pode ver o jogo completo clicando aqui) e que faria o camisa 10 receber uma suspensão de três meses. Anos depois, Maradona declarou que ficou desgostoso com a falta de esforço do Barcelona em defendê-lo nos tribunais desportivos e aceitou a oferta no Napoli, da Itália, encerrando uma passagem de dois anos na Catalunha. O craque argentino também revelou que foi lá que começou seu relacionamento com as drogas e que nunca sentiu confiança no então presidente Josep Lluís Núñez. Sem dinheiro, “Dieguito” faria as malas rumo à Nápoles para se encontrar com uma torcida incrivelmente apaixonada.

Na sua primeira temporada pelo Napoli, Maradona terminou o Campeonato Italiano em oitavo lugar. Em 1985/86, “Dieguito” levaria o escrete napolitano à terceira posição no Calcio. Nesse período, a Seleção Argentina já era comandada por Carlos Bilardo e o treinador já preparava a equipe para a Copa do Mundo do México. Vale lembrar ainda que a imprensa argentina questionava a convocação do camisa 10 e seu posto de capitão da Albiceleste. Ao mesmo tempo, na Itália, Maradona era considerado apenas um bom jogador e um “malabarista”. Para a alegria de todos nós, amantes do futebol, Bilardo ignorou os críticos e transformou o camisa 10 no principal jogador da sua equipe. O que poucos sabiam é que o México seria palco de uma das maiores (senão a maior) atuação individual de um jogador na história das Copas do Mundo. Foi lá que o craque se transformou em Deus. Ou melhor, “D10S”. Sem qualquer exagero.

Carlos Bilardo armou um 3-3-2-2 que liberava Maradona para circular por todo o campo e que marcava forte na defesa e no meio-campo. Ao lado do camisa 10 estavam jogadores de raro talento como o atacante Valdano e o meia Burruchaga. Mas aquela era a Copa de “Dieguito”. Ainda mais quando o argentino fez o que fez com a Inglaterra no jogo válido pelas quartas de final do Mundial. Usou “La mano de Dios” para abrir o placar (e vencer o corpulento goleiro Peter Shilton) e driblou quase todo o English Team antes de marcar aquele que seria considerado o gol mais bonito da história das Copas e o gol do século em enquete promovida em 2002. Depois da Inglaterra, Maradona faria mais dois gols em cima da Bélgica (e respondendo as críticas do goleiro Pfaff) e comandaria a Argentina na decisão tensa e brigada com a Alemanha Ocidental. O camisa 10 se transformava em divindade. Em “D10S”.

Argentina 1986 - Football tactics and formations

Carlos Bilardo armou um 3-3-2-2 para liberar Maradona para circular por todos os cantos e marcar gols como sabia bem. A partida contra a Inglaterra (por conta da rivalidade provocada pela Guerra das Malvinas ocorrida três anos antes) seria marcada pela “mano de Dios” e pelo gol antológico marcado na segunda etapa.

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Maradona inicia a temporada de 1986/87 já consagrado como o maior jogador do mundo e é peça fundamental na conquista do primeiro Campeonato Italiano da história do Napoli, formando dupla de ataque poderosa com o brasileiro Careca. No mesmo ano, conquista também a Copa da Itália ao bater a Atalanta na decisão. A temporada seguinte, no entanto, não é das melhores. O bicampeonato nacional acaba escapando por três pontos para o Milan de Van Basten e Ruud Gullit e o Napoli é eliminado ainda na primeira fase da antiga Copa dos Campeões da UEFA (a atual Liga dos Campeões) pelo Real Madrid. Mesmo assim, o escrete de Nápoles passaria a ser mais respeitado e temido pelos muitos adversários na Europa. Ainda mais com Maradona jogando em alto nível e provando seu valor em todas as partidas da sua equipe. O ano de 1989 reservaria a cereja do bolo para a cidade do sul da Itália.

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Apesar de ver o título do Calcio daquela temporada ficar com a Internazionale de Milão, Maradona liderou o Napoli na conquista da Copa da UEFA (a atual UEFA Europa League) jogando como “enganche” no 4-3-1-2 do italiano Ottavio Bianchi. O time ainda contava com Careca (formando dupla de ataque com Andrea Carnevale), o também brasileiro Alemão, o defensor Ciro Ferrara e o volante De Napoli. Nas fases finais da competição europeia, o escrete napolitano passou pela rival Juventus e pelo sempre poderoso Bayern de Munique até superar o Stuttgart em dois jogos (no regulamento da época). No primeiro, vitória por 2 a 1 com gols de Careca e de Maradona. No segundo (realizado na Alemanha), empate em 3 a 3 e a confirmação da única conquista internacional do Napoli até hoje. Tudo por conta da genialidade de “Dieguito” e de um time coeso, consistente e muito bem organizado.

Napoli 1989 - Football tactics and formations

O técnico Ottavio Bianchi armou um 4-3-1-2 para encaixar Maradona como “enganche” num Napoli que entrou para a história de maneira meteórica com os títulos inéditos do Campeonato Italiano e da antiga Copa da UEFA. O camisa 10 jogava com liberdade e ainda marcava muitos gols.

Maradona conquista mais um Campeonato Italiano em 1989/90 com o Napoli e vive o auge da carreira. A veneração ao seu redor era tão grande que “Dieguito” se sentiu à vontade para pedir aos torcedores que torcessem pela Argentina e não pela Itála durante a disputa da Copa do Mundo de 1990. “Durante trezentos e sessenta e quatro dias do ano, vocês são considerados pelo resto do país como estrangeiros e, hoje, têm de fazer o que eles querem, torcendo pela seleção italiana. Eu, por outro lado, sou napolitano durante os trezentos e sessenta e cinco dias do ano“, afirmou naquele tempo. Os dirigentes italianos chegaram a ir a público pedir que os cidadãos napolitanos torcessem pela Squadra Azzurra e até mesmo ordenaram a realização de pesquisas de opinião para calcular o tamanho do “estrago” daquelas declarações de Maradona às vésperas do início da Copa do Mundo.

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Apesar da fama e do favoritismo, a Albiceleste não começou bem aquele Mundial: derrota para a surpreendente equipe de Camarões na estreia por 1 a 0, vitória sobre a União Soviética (2 a 0) e empate com a Romênia (1 a 1). Esses resultados, no entanto, seriam suficientes para classificar a Argentina como uma das melhores terceiras colocadas da fase de grupos por conta do regulamento da época. E Maradona mostraria a sua genialidade nas oitavas de final, justamente contra o Brasil, algoz na Copa do Mundo de 1982 e na Copa América de 1989. Este que escreve, inclusive, conheceu “Dieguito” aos nove anos de idade quando este driblou toda a defesa brasileira antes de servir Caniggia, o autor do único gol da partida. Enquanto os argentinos (e principalmente Maradona) comemoravam a classificação, este então jovem torcedor chorava a eliminação da Seleção Brasileira da Copa do Mundo da Itália.

Argentina 1990 - Football tactics and formations

Carlos Bilardo manteve seu 3-3-2-2 na Copa do Mundo da Itália, em 1990. Maradona seguia como a referência da equipe argentina apesar da nítida queda de rendimento com relação ao Mundial do México. Mesmo assim, essa equipe foi responsável pela eliminação da Seleção Brasileira nas oitavas de final da competição.

A Argentina ainda passaria pela Iugoslávia e pela Itália (fato que acirrou ainda mais os ânimos no país) antes de cair diante da Alemanha Ocidental na decisão. Mas a temporada seguinte (1990/91) seria marcante para “Dieguito” por outro motivos. O vício em cocaína seria escancarado com depois de seu teste antidoping detectar a droga em seu sangue após uma partida contra o Bari. Chegou a ser preso na Argentina sob efeito de drogas e ainda veria todos duvidarem de sua capacidade depois de ganhar peso antes da Copa do Mundo de 1994. Conseguiu voltar a tempo de fazer parte da equipe de Alfio Basile junto com nomes da então nova geração de jogadores argentinos, como Ariel Ortega, Gabriel Batistuta, Diego Simeone, Abel Balbo e Fernando Redondo. No entanto, acabaria testando positivo para a substância efedrina na partida contra a Nigéria, na segunda rodada da fase de grupos.

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Maradona passaria por diversos clubes antes de encerrar definitivamente a carreira no final da década de 1990. Voltaria à Seleção Argentina dez anos depois para comandar a equipe na Copa do Mundo da África do Sul, em 2010, onde montou um 4-1-3-2 que soltava Messi para encostar na dupla de ataque (formada por Carlitos Tévez e Gonzalo Higuaín) e que tinha em Mascherano o único jogador de marcação no meio-campo. Na fase de grupos, a Albiceleste venceu a Nigéria (1 a 0), a Coreia do Sul (4 a 1) e a Grécia (2 a 0). Passou pelo México (3 a 1) nas oitavas de final, mas parou na Alemanha de Joachim Löw nas quartas: goleada por 4 a 0 sem dó nem piedade. Após a saída da Copa do Mundo, Diego Maradona deixou o comando da Seleção Argentina sendo duramente criticado pela imprensa portenha por conta das suas escolhas questionáveis e do futebol sem muito padrão de jogo apresentado pela sua equipe.

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Argentina 2010 - Football tactics and formations

Maradona assumiu a Seleção Argentina em 2008 e classificou a sua equipe para a Copa do Mundo de 2010 com seu 4-1-3-2 que liberava Messi e sobrecarregava a defesa. A eliminação para a Alemanha nas quartas de final viria acompanhada de severas críticas da imprensa portenha relacionadas ao futebol apresentado pela equipe.

Diego Armando Maradona teve vida tão intensa como seu futebol. Infelizmente, o corpo já bastante castigado não aguentou o peso de anos de abuso de drogas. Vai-se um dos maiores jogadores de todos os tempos, talvez um dos poucos que possa ser comparado a Pelé e outras lendas do velho e rude esporte bretão. Mas foi o único que foi uma divindade com a bola nos pés. O único que conseguiu se transformar em símbolo de um povo apaixonado por futebol e um dos poucos que era conhecido pela autenticidade do seu pensamento nos mais diversos assuntos. Pode ser que ainda demore um pouco para que o mundo conheça outro “Dieguito”. O que é certo é que ninguém estava preparado para a partida do “D10S” mais humano que eu e você conhecemos. Goste dele ou não, Maradona deixou os gramados para se transformar em lenda e povoar o imaginário de todos nós. Gracias, Dieguito. Gracias.

FONTES DE PESQUISA:

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A Pirâmide Invertida, por Jonathan Wilson (Editora Grande Área)
Tatica Mente, por Paulo Vinícius Coelho (Editora Saraiva)
As melhores Seleções Estrangeiras de todos os tempos, por Mauro Beting (Editora Contexto)
Sarriá 1982 – O que faltou ao futebol-arte?, por Gustavo Roman e Renato Zanata (Maquinária Editora)
RSSSF Internacional
Site oficial da FIFA
BLOG Três Pontos: 03/07/2010 – Alemanha 4 x 0 Argentina
BLOG Três Pontos: 02/07/1982 – Brasil 3 x 1 Argentina

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