Home Futebol Intensidade, organização ofensiva e volume de jogo insano: a aula de futebol (e de empatia) do Liverpool

Intensidade, organização ofensiva e volume de jogo insano: a aula de futebol (e de empatia) do Liverpool

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa a goleada do time de Jürgen Klopp sobre o Manchester United de Ralf Rangnick nesta terça-feira (19)

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

Este colunista sempre rebateu o argumento de que o “verdadeiro” futebol só foi praticado nos anos 1960 e 1970, época em que o velho e rude esporte bretão era dominado por uma onda mais romântica e encarado de maneira muito mais inocente do que nos nossos dias. A goleada do Liverpool sobre o Manchester United em jogo disputado nesta terça-feira (19), em Anfield Road, é uma das inúmeras provas de que podemos sim ver um futebol de altíssima qualidade atualmente. E nesse ponto, é praticamente impossível não se encantar com a grande atuação coletiva do escrete comandado por Jürgen Klopp. Intensidade alta, organização ofensiva e defensiva, um volume de jogo que beira a insanidade de tão grande e belos gols. Salah (duas vezes), Mané e Luis Díaz marcaram os gols da vitória sobre um Manchester United completamente apático.

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Aula de futebol e também de empatia. Num mundo tão polarizado e tão dividido por “tribos” e “bolhas”, ver a torcida do Liverpool iniciar uma verdadeira onda de aplausos em homenagem ao craque Cristiano Ronaldo aos sete minutos de partida por conta da perda do seu filho no início da semana é algo que realmente enche o coração de esperança. Se podemos ser melhores observando, estudando e analisando o velho e rude esporte bretão, também podemos ser pessoas melhores. Podemos ser mais humanos e nos solidarizar com a dor alheia. Mesmo que ela seja do jogador do grande rival do nosso time do coração. O futebol nos ensina todos os dias a sermos melhores do que éramos ontem.

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É por esse e outros motivos que o jogo desta terça-feira (19) merece ser lembrado por muito tempo. Não somente pelo banho de bola que o Liverpool de Jürgen Klopp deu no Manchester United de Ralf Rangnick, mas por todas as demonstrações de civilidade e espírito esportivo que tivemos no Anfield Road. Ainda que a vitória sobre os Red Devils seja fundamental para que o time de Salah, Mané, Luis Díaz e Thiago Alcântara siga na briga pelo título da Premier League de 2021/22, houve tempo para as homenagens e os abraços de todos em Cristiano Ronaldo e na sua família. Este que escreve não consegue pensar em melhor exemplo de empatia no futebol. Não pelo menos nos últimos cinco anos.

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Sobre o jogo em si, precisamos reconhecer que o Liverpool nos brindou com uma apresentação quase perfeita. O 4-3-3 de Jürgen Klopp tinha forte saída pelos lados com Alexander-Arnold e Robertson, qualidade e força na marcação com Fabinho e Henderson, muita dinâmica na ligação com o ataque proporcionada por Thiago Alcântara e um volume de jogo absurdo com o trio ofensivo formado por Luis Díaz, Mané e Salah. O colombiano era a referência móvel e abria espaços para as chegadas dos companheiros de equipe nos buracos que a linha de cinco do Manchester United deixava na frente da sua área. Tanto que os Reds já venciam o jogo por 2 a 0 aos 21 minutos de partida em Anfield Road. Do outro lado, o Manchester United tentava se defender como podia e só conseguia levar perigo nas bolas longas para Elanga e Rashford às costas da defesa do Liverpool.

Jürgen Klopp mandou o Liverpool a campo no seu costumeiro 4-3-3 e teve em Thiago Alcântara o “motorzinho” da sua equipe em Salah o fator de desequlíbrio pela direita. Tudo para explorar as deficiências de um Manchester United sem brilho. Foto: Reprodução / YouTube / ESPN Brasil

A desvantagem no placar fez com que Ralf Rangnick desfizesse a linha de cinco defensores no segundo tempo com a entrada de Jadon Sancho no lugar de Phil Jones. Com o ataque mais encorpado, o Manchester United conseguiu criar problemas para a defesa do Liverpool e até pressionar a equipe da casa com passes longos às costas da zaga formada por Matip e Van Dijk. Mesmo assim, os Red Devils só conseguiram criar apenas uma chance de gol. Aos 18 minutos, Rashford e Elanga obrigaram Alisson a fazer duas boas defesas após lançamento de Sancho pela esquerda (em lance que seria anulado por impedimento). Depois disso, o Liverpool retomou o controle da partida.

É preciso dizer que pouquíssimas equipes atacam e contra-atacam como a comandada por Jürgen Klopp. Toda a construção do terceiro gol dos Reds (marcado por Mané aos 22 minutos do segundo tempo) mostra bem isso. Desde a pressão no portador da bola por parte de Robertson e a troca de passes que terminou no chute certeiro do senegalês. E para fechar a noite, o mesmo camisa 26 iniciou a jogada do quarto gol praticamente do mesmo jeito. Pressão, passe rápido e transição intensa. A leitura de Diogo Jota da movimentação de Salah no espaço entre os zagueiros do Manchester United foi qualquer coisa de sensacional. Uma verdadeira aula sobre o que é futebol de alta qualidade.

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Diogo Jota inicia o contra-ataque e vê Salah atacando o espaço entre Wan-Bissaka e Maguire da direita para dentro no lance do quarto gol do Liverpool. O time comandado por Jürgen Klopp deu uma aula de contra-ataque, transição e leitura dos espaços na defesa adversária. Foto: Reprodução / YouTube / ESPN Brasil

Diogo Jota inicia o contra-ataque e vê Salah atacando o espaço entre Wan-Bissaka e Maguire da direita para dentro no lance do quarto gol do Liverpool. O time comandado por Jürgen Klopp deu uma aula de contra-ataque e leitura dos espaços na defesa adversária. Foto: Reprodução / YouTube / ESPN Brasil

Toda a intensidade que vimos no jogo desta terça-feira (19) já é algo bastante normal para quem acompanha o Liverpool de Salah, Mané, Van Dijk, Alexander-Arnold, Alisson e Jürgen Klopp. O que impressiona é a clara tendência de melhora no desempenho do time nessa reta final de temporada na Europa. A impressão que fica é a de que os Reds podem tirar ainda mais coelhos da cartola e competir num nível ainda mais alto do que esse que estamos vendo ultimamente. Precisamos aqui destacar as grandes atuações de Luis Díaz (jogador que se encaixou como uma luva de seda no time) e de Thiago Alcântara. Aliás, o brasileiro naturalizado espanhol finalmente conseguiu adaptar seu futebol ao estilo agressivo de Jürgen Klopp. É ele quem dá a pausa e acelera quando necessário. E poucos volantes no mundo sabem fazer isso como o camisa 6 do Liverpool faz.

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A goleada sofrida no Anfield Road também escancara (mais uma vez) a fase ruim do Manchester United. Aliás, é difícil entender o que se passa lá pelos lados de Old Trafford. O elenco à disposição de Ralf Rangnick tem muita qualidade, ótimos talentos individuais, mas não dá liga de jeito nenhum. Ao mesmo tempo, o time sentiu muito a ausência do brasileiro Fred no meio-campo e segue sofrendo demais com as “trapalhadas” do sistema defensivo. Por mais que o Liverpool tenha todos os méritos na construção do resultado desta terça-feira (19), o que se via em Alfield Road era um time perdido, sem consistência e que dependia de uma única jogada (as bolas longas na direção de Rashford e Elanga) e o até agora inexplicável posicionamento de Bruno Fernandes (justo um dos poucos jogadores lúcidos dos Red Devils) preso pelo lado do campo.

Intensidade, volume de jogo, organização, empatia e civilidade. A vitória justíssima do Liverpool sobre o Manchester United deixa a certeza de que podemos ser muito melhores como analistas, jornalistas e debatedores e também como pessoas. O futebol nos aponta o caminho a seguir todos os dias apesar dos nossos preconceitos e atavismos. Basta querermos dar uma chance. Exatamente como a torcida dos Reds fez com Cristiano Ronaldo.

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