Home Futebol Lyon supera o Barcelona, reconquista a Europa e mostra como certas competições devem ser jogadas

Lyon supera o Barcelona, reconquista a Europa e mostra como certas competições devem ser jogadas

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa a final da Liga dos Campeões Feminina e as estratégias de Jonatan Giráldez e Sonia Bompastor

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

O jargão popular do futebol costuma dizer que algumas equipes acabam se acostumando a disputar determinadas competições. Funciona mais ou menos dessa forma com River Plate e Boca Juniors na Copa Libertadores da América e com o Real Madrid na UEFA Champions League. Essa “máxima” da sabedoria de botequim do velho e rude esporte bretão foi comprovada com a vitória do Lyon sobre o badalado Barcelona neste sábado (21), em Turim. A equipe de Endler, Renard, Macario, Ada Hegerberg e companhia fez uma partida taticamente quase perfeita e conquistou a OITAVA Liga dos Campeões Feminina da equipe francesa. Ainda que o escrete comandado por Sonia Bompastor não seja o preferido de muitos, ficou claro que o Lyon sabe muito bem como se comportar em jogos grandes e como se deve encarar uma decisão continental.

Não que o Barcelona de Alexia Putellas, Hermoso, Claudia Pina, Sandra Paños e María Pilar León não tenha merecido a vaga na decisão. O ponto aqui é outro. Isso porque o Lyon já se transformou no tipo de equipe acostumada a disputar uma competição (no caso, a Liga dos Campeões Feminina). Além disso, a campanha do escrete francês fala por si só. Primeira colocação no Grupo D (à frente de Bayern de Munique, Benfica e do sueco BK Häcken) e vitórias sobre Juventus e Paris Saint-Germain antes de chegar à finalíssima da competição que mostra conhecer muito bem. E a atuação do time de Sonia Bompastor nos apresentou um Lyon focado, intenso e muito organizado em cada lance contra um Barcelona forte e ofensivo.

Tudo começa com o Lyon adiantando as linhas e tirando o espaço de circulação do seu forte adversário. Macario e Ada Hegerberg fechavam por dentro e forçavam o erro de Patricia Guijarro na saída de bola do Barcelona. Cascarino e Malard se impunham pelos lados do campo na base da velocidade e da imposição física pra cima das laterais Marta Torrejón e Fridolina Rolfö e as volantes Amandine Henry e Lindsey Horan cuidavam de Alexia Putellas. O 4-2-3-1 de Sonia Bompastor muito organizado, bastante compactado e altamente intenso nas suas transições ofensivas e defensivas. Nem mesmo a saída de Ellie Carpenter (lesionada) logo nos primeiros minutos de partida desestruturou o sistema defensivo do Lyon.

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Formação incial das duas equipes no Juventus Stadium. Sonia Bompastor manteve o 4-2-3-1 num Lyon consistente, intenso e com o claro objetivo de explorar os espaços do 4-3-3 tradicional do Barcelona comandado por Jonatan Giráldez.

É verdade que o golaço marcado por Amandine Hanry logo aos seis minutos de jogo acabou deixando o cenário favorável ao Lyon. O time de Sonia Bompastor se fechou com duas linhas na frente da sua área e contava com a excelente Renard auxiliando suas companheiras de equipe no controle da profundidade. Henry e Horan fechavam por dentro, Cascarino e Malard se somavam às laterais dependendo do setor por onde as jogadas se desenrolavam e Macario se comportava como mais uma volante em determinados momentos (formando uma linha de cinco no meio-campo). Por mais que o Barcelona tivesse a posse da bola, o escrete catalão encontrava muitas dificuldades para entrar na área adversária. E quando conseguia fazer a bola chegar no setor ofensivo, o time de Jonatan Giráldez não conseguia concluir a gol com qualidade.

O Lyon fechava muito bem as entradas da sua área quase em um 4-5-1 com forte marcação e muita intensidade nas transições. O Barcelona sofreu muito para fazer a bola chegar no ataque. Foto: Reprodução / YouTube / DAZN UEFA Women’s Champions

Precisamos dizer que o Barcelona não se abateu muito com o gol e manteve a sua postura mais ofensiva na execução do “jogo de posição” proposto por Jonatan Giráldez. Alexia Putellas tinha liberdade para circular por todo o campo embora sofresse bastante com a marcação do Lyon. Ada Hegerberg fez o segundo gol aos 23 minutos (em belíssima triangulação pela esquerda envolvendo Malard e Selma Bacha) e Macario fez o terceiro aos 33 minutos depois de apagão na zaga blaugrana. E nesse ponto, vale destacar como Sonia Bompastor posicionou suas jogadoras de modo a atacar os “pontos cegos” do 4-3-3 de Jonatan Giráldez. Sempre que Macario pegava a bola, todo o time do Lyon atacava o espaço e arrastava a marcação. Lindsay Horan, Ada Hegerberg, Malard, todos participavam dessas transições em alta velocidade.

As transições ofensivas eram o ponto alto do Lyon. Macario carregava a bola por dentro e Ada Hegerberg, Malard, Cascarino e até Lindsay Horan apareciam no campo de ataque do Barcelona. Foto: Reprodução / YouTube / DAZN UEFA Women’s Champions

O gol de Alexia Putellas (marcado aos 41 minutos do primeiro tempo) ainda deu a impressão de que o Barcelona teria forças para buscar o empate e a virada. Tanto que Jonatan Giráldez apostou na nigeriana Asisat Oshoala para dar mais mobilidade ao ataque da sua equipe e foi fazendo mais uma série de substituições durante a segunda etapa. O Lyon, por sua vez, manteve o plano de Sonia Bomtempo, se fechou na frente da sua área e passou a jogar nos contra-ataques buscando a velocidade de Ada Hegerberg e Macario às costas da defesa. Por mais que o Barcelona tivesse mais a posse e circulasse bastante na intermediária ofensiva, faltava a intensidade necessária para furar o forte bloqueio defensivo do seu adversário. Na prática, o escrete francês foi administrando a vantagem até o apito final em Turim.

Jonatan Giráldez tentou colocar o Barcelona no ataque com as entradas de Oshoala, Crnogorčević, Martens e Claudia Pina, mas esbarrou na ótima marcação do Lyon na frente da área. Ótima atuação do sistema defensivo do escrete francês.

A postura do Lyon durante toda a Liga dos Campeões Feminina vai na linha do primeiro parágrafo desta humilde análise. As jogadoras comandadas por Sonia Bompastor sabem exatamente como disputar uma competição desse porte e mostraram um nível de concentração altíssimo para conquistar o continente pela oitava vez. Não que elas consigam fazer tudo isso parecer fácil. Mas vale destacar aqui que alguns colegas de imprensa já davam o Barcelona como o campeão e se esqueciam que Endler, Renard, Macario, Ada Hegerberg e mais uma porção de atletas experientes e vitoriosas estavam do outro lado do campo. Muitas delas, inclusive, participaram de conquistas anteriores. Os níveis de concentração, de aplicação tática e de intensidade foi altíssimo. E isso ajudou demais no resultado conquistado em Turim.

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Certo é que a Liga dos Campeões Feminina está em ótimas mãos. E pela oitava vez. O Lyon pode não ser o time preferido de todos, mas provou que seu legado no futebol ainda está longe de terminar. Poucas equipes no mundo se identificam tanto com uma competição como a comandada por Sonia Bompastor. E ao Barcelona resta a lição de que não basta o “hype”. É preciso entender que o esporte praticado em alto nível permite pouquíssimas falhas e uma força mental muito grande.