Home Futebol Ronald Koeman no Barcelona: aposta certeira ou apego ao passado?

Ronald Koeman no Barcelona: aposta certeira ou apego ao passado?

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o que estaria por trás da chegada do ex-zagueiro holandês ao Barça e como ele pode recuperar o moral do clube

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

Uma das grandes questões do futebol atual gira em torno da “identidade” de um determinado time. Há clubes que são conhecidos por uma maneira quase única de tratar a bola dentro de campo. Por muito tempo, a Internazionale ficou conhecida pelo “catenaccio” de Helenio Herrera, o Milan está marcado pelos conceitos implementados por Arrigo Sachi e o Ajax virou sinônimo de “Futebol Total” com Rinus Michels e Johan Cruyff. O grande problema é quando essa “identidade” precisa de atualizações e ajustes para se adequar às inovações do velho e rude esporte bretão. É o que acontece com o Barcelona. A chegada do holandês Ronald Koeman pode significar um retorno ao passado marcado pelo “Dream Team” dos anos 1990. O problema é saber até onde essa escolha pautada em razões mais afetivas do que profissionais pode ajudar o Barça a recuperar o protagonismo perdido nos últimos anos.

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É óbvio que só o tempo dirá se Koeman vai dar certo no Barcelona ou não. O tempo e uma série de outros fatores. Por outro lado, a surra que o clube catalão levou do Bayern de Munique nas quartas de final da última Liga dos Campeões escancarou a crise nos bastidores blaugranas. Crise tão grande que fez o zagueiro Piqué se colocar à disposição para deixar o Barça para facilitar uma renovação mais do que necessária de nomes e de ideias. A geração campeã continental e mundial em 2015 já passa dos trinta anos de idade e já mostrava claros sinais de desgaste ainda com Ernesto Valverde (fato que obrigou o treinador utilizasse um esquema mais pragmático para dar consistência defensiva ao time). A sua saída e a aposta em Quique Setién (adepto das ideias de Johan Cruyff) só afundaria ainda mais o moral de um clube que estava preso ao passado e que precisava avançar.

A única certeza que este que escreve tem é a de que o Barcelona precisa de uma verdadeira revolução em todos os sentidos. Ronald Koeman, pela história no clube e por ter feito parte de uma das épocas mais vitoriosas do escrete blaugrana e marcado gol de título da Champions League em 1991/92 diante da Sampdoria. Não deixa de ser uma escolha baseada em lembranças afetivas de um tempo em que o Barça mandou e desmandou no futebol. Principalmente com o “Dream Team” idealizado por Cruyff. A mesma equipe que jogava numa espécie de 3-3-1-3 (e que se desdobrava num ofensivo 3-3-4 conforme a movimentação de Laudrup e Bakero) e que ficou ainda mais imprevisível e “rebelde” com a chegada de Romário em 1993. A goleada por 5 a 0 em cima do Real Madrid em pleno Santiago Bernabéu foi o ápice daquela equipe que jogava um futebol alegre e vibrante.

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Barcelona - Football tactics and formations

O “Dream Team” do Barcelona ganhou ainda mais força com a chegada de Romário em 1993. E o ápice daquela geração aconteceu no ano seguinte, com a goleada por 5 a 0 sobre o Real Madrid dentro do Santiago Bernabéu com grande exibição coletiva de toda a equipe comandada por Johan Cruyff.

O Barcelona ainda ganharia mais notoriedade com Guardiola no comando da histórica equipe que revolucionou o futebol com trocas de passe quase intermináveis no campo e com Messi desequilibrando com o auxílio luxuoso de Xavi, Iniesta, Puyol, David Villa, Abidal, Daniel Alves e Busquets. No entanto, o próprio Guardiola já afirmou mais de uma vez que aquele time ficou no passado e já reformulou várias vezes seu estilo para se adaptar ao futebol cada vez mais físico e intenso dos nossos dias. É preciso mais velocidade e mais objetividade para definir as jogadas. Coisa que o Bayern de Munique de Hans-Dieter Flick fez muito bem na última edição da Liga dos Campeões contra o próprio Barcelona. E o estilo defendido por muitos dentro do clube (o chamado “tiki-taka”) só aumenta as chances de equipes mais intensas roubarem a bola ou se organizarem na defesa.

O ponto aqui é simples: a chegada de Ronald Koeman no Barcelona é uma aposta certeira ou apenas o apego ao passado? Embora o currículo como treinador não empolgue muito (a conquista que mais salta aos olhos é a da Copa do Rey de 2007/08 com o Valencia), a filosofia de Johan Cruyff ainda está presente no discurso e a experiência recente com o Southampton e o Everton na Premier League deu mais “casca” ao ex-líbero. Na prática, no entanto, Koeman tende a ser um pouco mais pragmático. Seus últimos trabalhos foram pautados em cima do 4-1-4-1 e do 5-3-2 com equipes bem fechadas e rápidas no contra-ataque. Elementos que podem ser úteis na montagem de um time que pode adaptar a “filosofia” do Barcelona ao jogo mais intenso e mais físico dos nossos dias sem perder a consistência defensiva, uma das grandes pedras no sapato do escrete blaugrana nas últimas temporadas.

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Simbolicamente, a chegada de Ronald Koeman também atende aos anseios daqueles mais saudosos dos tempos de vitórias e títulos no Barcelona. Principalmente quando o treinador em questão foi treinado por Rinus Michels na Seleção Holandesa campeã da Eurocopa de 1988 e por Johan Cruyff no “Dream Team” do início dos anos 1990. O grande X da questão é saber a medida certa do saudosismo nessa equação. Este que escreve já mencionou mais de uma vez a necessidade do Barcelona de se reinventar dentro e fora de campo. E por mais que Koeman seja sim uma referência para quem está chegando ao clube e até para os mais jovens, ainda existe a necessidade de se resolver o destino dos mais experientes. Incluindo Messi que, até onde se sabe, não parece disposto a continuar no clube. E isso tendo que usar o dinheiro para fazer contratações que possam elevar o patamar do time.

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Fora que as últimas atuações do time na temporada passada beiraram o ridículo. Principalmente quando se sabe que cada jogador poderia entregar muito mais em campo. Mesmo os experientes. Por outro lado, a diretoria do Barcelona errou feio e errou rude na contratação de nomes bastante discutíveis. Atletas mais caros, como Griezmann e Dembelé não saíram do banco de reservas na goleada sofrida contra o Bayern de Munique por não passarem confiança. Diante disso, a missão de Koeman é bem clara: reorganizar o elenco, montar a estratégia e usar seu prestígio de líder do “Dream Team” dentro de campo para unir e reunir as forças dentro do clube. Mesmo que isso cause a saída de Piqué, Busquets e Suárez, nomes que fizeram demais pelo Barça e que foram os melhores das suas posições por muito tempo. Até há meios de adaptá-los dentro do elenco. Mas a tal “filosofia”, o tal “DNA” do clube precisa se adaptar aos novos tempos.

Barcelona vs Bayern de Munique - Football tactics and formations

A atuação do Barcelona contra o Bayern de Munique nas quartas da Liga dos Campeões foi a prova clara de que as decisões da diretoria haviam afundado o time. E a grande missão de Koeman é (re)unir as forças, usar bem o dinheiro das contratações e tornar o escrete blaugrana forte novamente. Não é tarefa fácil.

Ivan Rakitic já deixou o Barcelona (rumo ao Sevilla) e a imprensa espanhola afirma que Arturo Vidal, Samuel Umtiti e Luís Suárez estariam fora dos planos de Koeman. O treinador holandês, inclusive, vê no compatriota De Jong o substituto ideal para Busquets (jogador que já não tem a mesma velocidade de anos passados) e aposta em nomes mais jovens para substituir aqueles que são considerados “descartáveis” pela comissão técnica e pela diretoria. Koeman ainda aguarda pela permanência de Messi apesar de já ter se “preparado psicologicamente” para a possível saída do maior ídolo da equipe em todos os tempos ou para ter que comandar um jogador que já demonstrou publicamente a sua insatisfação com a atual diretoria mais de uma vez. Se Messi permanecer, como será seu relacionamento com comissão técnica, dirigentes e torcedores? É algo difícil de ser resolvido.

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A tendência é vermos Ronald Koeman sendo usado muito mais como um escudo para a diretoria do Barcelona como alguém que realmente possa devolver o protagonismo ao clube catalão. É claro que o holandês pode dar certo e fazer com que sua equipe volte a jogar em alto nível. O grande problema é que isso depende de uma série de fatores que vão desde a permanência (ou não) de Messi chegando até às escolhas extremamente equivocadas de Josep Maria Bartomeu na presidência do Barça. Complicado enxergar um horizonte favorável.

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