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Paulo Autuori no Botafogo: incertezas, desafios e lembranças afetivas

Treinador de 63 anos tem a missão de recolocar o Glorioso no caminho das vitórias após início ruim em 2020; Paulo Autuori já deixou clara a sua preferência pelo 4-4-2 e por “volantes que jogam” nos seus últimos trabalhos no Brasil

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.
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Antes de mais nada, é preciso dizer que a escolha de Paulo Autuori para comandar o Botafogo não foi feita apenas baseada em lembranças afetivas. O treinador campeão brasileiro com o Glorioso em 1995 tem forte identificação com o clube, grande experiência nacional e internacional e bom conhecimento do que acontece dentro das quatro linhas. É bem verdade que seus últimos trabalhos não foram do mesmo nível das conquistas que teve comandando o Cruzeiro, o São Paulo e o próprio Botafogo e que sua atuação nos bastidores no Fluminense e do Santos. Por outro lado, Autuori pode ser o nome certo na hora certa para um time que ainda busca reencontrar seu melhor futebol em meio ao caos financeiro que tomou conta do Glorioso nas últimas temporadas. E nada impede que Paulo Autuori use as lembranças afetivas do título de 1995 ao seu favor para unir o grupo e deixar a equipe competitiva nessa temporada.

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Paulo Autuori já demonstrou a sua preferência pelo 4-4-2 (em detrimento do conhecido 4-2-3-1) mais de uma vez em entrevistas e nas equipes por onde passou. Vale a pena destacar um trecho de uma entrevista concedida ao globoepsorte.com em fevereiro de 2013, semanas antes de assumir o comando técnico do Vasco. “No meu conceito, o melhor sistema é o 4-4-2, que permite variações. Podem ser quatro em linha no meio, que se usa muito na Europa. Pode ser o diamante, que são três no meio com um mais adiantado, que o Vanderlei (Luxemburgo) gosta de jogar. O que não entendo no 4-2-3-1 é que os dois caras por fora têm de ter capacidade física muito grande de ir e vir, leitura de jogo e orientação para quando a bola estiver de um lado, o cara do outro extremo fechar. E eles têm de ser atacantes porque quando o meia busca a bola atrás para organizar o jogo, eles têm de se enfiar para não isolar o centroavante. Senão perde efetividade. É interessante, já usei fora do Brasil, e bem, mas tinha jogadores com essas características” – explicou Autuori.

Essa preferência pelo 4-4-2 foi bem percebida quando Paulo Autuori comandou o Botafogo e levou o time da Estrela Solitária à conquista do Campeonato Brasileiro em 1995 (quebrando um jejum de quase trinta anos sem conquistas a nível nacional). Aquele time possuía defesa forte (com o goleiro Wagner em grande fase e Wilson Gottardo e Gonçalves formando uma dupla de zaga afinada e experiente), meio-campo que aliava força na marcação (com Leandro Ávila e Jamir) e qualidade no passe (com Beto e Sérgio Manoel) e muita qualidade no setor ofensivo (com Donizete Pantera e Túlio Maravilha formando uma das melhores duplas de ataque do clube nas últimas décadas). Paulo Autuori tinha em mãos um time que aliava bom toque de bola, consistência na defesa, jogadas fortes pelas laterais e muitos gols. Foram 13 vitórias, seis empates e apenas quatro derrotas no Brasileirão de 1995, com 42 gols marcados e apenas 22 sofridos.

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Botafogo 1995 - Football tactics and formations

Paulo Autuori conquistou o título brasileiro em 1995 armando o Botafogo num 4-4-2 (que se desdobrava num 4-2-2-2 típico daqueles tempos) aliando muita força defesa e muita qualidade na frente. Donizete Pantera e Túlio Maravilha se completavam e formaram uma das melhores duplas de ataque do Glorioso nos últimos anos.

Dois anos depois, no comando do Cruzeiro, Paulo Autuori repetia a sua preferência pelo 4-4-2/4-2-2-2 numa equipe que conquistou a Copa Libertadores da América com uma vitória sobre o Sporting Cristal na decisão. A Raposa de 1997 tinha força pelas laterais (com Vítor e o ídolo Nonato), experiência na zaga (novamente com o já veterano Wilson Gottardo e agora com Gelson Baresi), qualidade na saída de bola com Fabinho e Ricardinho, muita criatividade com Donizete Oliveira e Palhinha, muita velocidade pela esquerda com Elivélton e gols, gols e mais gols com Marcelo Ramos. O desenho tático era o mesmo de 1995 com o Botafogo, mas Paulo Autuori conseguiu fazer do Cruzeiro algo bem próximo daquilo que ele acredita e defende para suas equipes. Não por acaso a Raposa foi campeã mineira e da Libertadores no mesmo ano de 1997 com o treinador no banco de reservas.

Cruzeiro 1997 - Football tactics and formations

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Paulo Autuori manteve suas convicções e sua maneira de jogar no Cruzeiro campeão mineiro e da Libertadores em 1997. O mesmo 4-4-2 de duas temporadas anteriores encaixou perfeitamente os talentos de nomes como Ricardinho, Donizete Oliveira, Palhinha, Elivélton e Marcelo Ramos.

Depois de passar por vários clubes do Brasil e do exterior (incluindo a Seleção Peruana na Copa América de 2004), Paulo Autuori chegou ao São Paulo em 2005. E depois de alguns dias, o treinador definiu o 3-5-2 como o desenho tático da equipe. O próprio Autuori  falou em entrevistas antes da decisão da Copa Libertadores da América daquele ano (conquistada pelo Tricolor Paulista) que sua equipe rendia mais atuando com três zagueiros e que o sistema era o que melhor se encaixava com o jeito de jogar do Athletico Paranaense. Mesmo jogando num sistema diferente do seu 4-4-2, o São Paulo de Paulo Autuori mantinha algumas das principais características das suas equipes: volantes quem sabiam jogar (Josué e Mineiro), atacante de movimentação (Amoroso), centroavante de referência (Aloísio Chulapa) e jogo forte pelas laterais com as subidas constantes de Cicinho e Júnior. Resultado: campeão da Libertadores e do Mundial de Clubes da Fifa com uma vitória marcante sobre o Liverpool de Gerrard e Rafa Benítez.

Sao Paulo 2005 - Football tactics and formations

Paulo Autuori entendeu que o esquema que melhor encaixava os talentos que tinha à disposição no São Paulo era o 3-5-2. Foi com esse desenho tático (e com elementos que utilizava no seu 4-4-2 tradicional) que o treinador levou o Tricolor Paulista ao título da Copa Libertadores da América e do Mundial de Clubes da FIFA.

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Vale lembrar ainda que Autuori já mostrou a sua preferência por volantes que sabem jogar mais de uma vez. Reproduzimos um trecho da sua entrevista ao programa “Bola da Vez”, da ESPN Brasil, em 2013: “Pra mim, uma grande equipe tem que ter volantes que jogam. Como já falei, é onde você começa a organização da equipe, com passe limpo, qualidade de jogo. É quando você ganha volume de jogo. Você põe os volantes no campo do adversário. Se a bola está lá no canto direito, como é que você vai rodar, com passes curtos, para a esquerda? Usando esses dois volantes que já estão no campo do adversário. Penso que jogadores de meio-campo tem que jogar como era Paulinho e Ralf, Mineiro e Josué. Por isso foram equipes vitoriosas por um longo período e não por um curto espaço de tempo” – explicou Autuori.

A grande dificuldade de Paulo Autuori, pelo menos nesses primeiros dias, é encontrar o time ideal para colocar seus conceitos em prática logo na próxima quarta-feira (19), na partida contra o Náutico, pela segunda fase da Copa do Brasil. O treinador já sabe que não poderá contar com o atacante Pedro Raul, grande destaque do Botafogo nesse início de temporada. E, se quiser repetir a mesma receita do time campeão de 1995, ele vai precisar de atletas que consigam executar funções bem definidas: volantes que “sabem jogar”, dois jogadores com capacidade de criação no meio-campo, um atacante de referência e outro de velocidade e laterais bons no apoio e na marcação. É possível pensar em uma série de nomes do elenco do Botafogo. O principal obstáculo é o tempo disponível. Por isso que dificilmente veremos grandes mudanças no jogo contra o Náutico. Nomes como Cícero, Gustavo Bochehca e o peruano Lecaros podem ganhar oportunidades. Pelo menos enquanto Honda ainda se recondiciona fisicamente.

A nova empreitada de Paulo Autuori no Botafogo está cercada de desafios e incertezas. Ele terá condições de trabalho ou terá que administrar os problemas financeiros do clube junto aos atletas? Diretoria e torcida terão paciência com ele caso os resultados não apareçam. De qualquer maneira, vale a pena sim se agarrar às lembranças afetivas de um passado vitorioso. Até para que Autuori possa repetir o que fez há 25 anos e recolocar o Glorioso no caminho dos títulos.

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