Home Futebol Copa América: Há 100 anos, Brasil excluía jogadores negros da Seleção

Copa América: Há 100 anos, Brasil excluía jogadores negros da Seleção

Por recomendação do presidente Epitácio Pessoa, na Copa América de 1921 apenas jogadores brancos representaram a seleção brasileira

Gabriel Mineiro
Colaborador do Torcedores

 

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Quando olhamos para a história da seleção brasileira de futebol, vemos que ela foi feita essencialmente por jogadores negros. E o que aconteceria se excluíssemos todos esses jogadores da história do Brasil? Sem Pelé, Brito, Carlos Alberto e Jairzinho, talvez não existisse o tricampeonato mundial de 1970. Sem Romário, seria uma missão quase impossível em 1994. Sem Ronaldinho e Rivaldo, o penta ainda seria um sonho. Sem Neymar, não estaríamos tão confiantes no hexa em 2022.

Pois é, soa ridículo quando essa hipótese é levantada. Mas a 100 anos atrás… também soou ridículo. Porém isso não impediu o presidente Epitácio Pessoa de “recomendar” que o Brasil só fosse representado por jogadores brancos na Copa América de 1921, na Argentina.

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1920, a vergonha argentina

A história começou no Sul-Americano (equivalente a Copa América) de 1920, sediada no Chile, onde o Brasil não teve um desempenho como em 1919 (ano em que foi campeão) e acabou ficando em terceiro lugar 一naquela época, apenas quatro equipes disputavam a competição. Após o fim do torneio, antes de voltar para casa, a seleção brasileira decidiu fazer uma “escala” na Argentina, para a disputa de um amistoso contra os donos da casa.

O Jornal A Crítica,  de Buenos Aires, tratou a chegada dos brasileiros de forma extremamente racista, em uma charge, eles ilustraram os jogadores brasileiros como macacos. Acompanhando a charge vinha um texto, em que eles demonstravam extremo “asco” pela pele negra:

 “Já estão os macaquitos em terra argentina. Esta tarde teremos que acender a luz às 4 da tarde para vê-los. (…) Se há uma gente que nos parece altamente cômica é a brasileira. São elementos de cor que se vestem como nós e pretendem se misturar à raça americana, gloriosa por seu passado e grande por suas tradições.”

Como já era de se esperar, a publicação irritou profundamente os jogadores brasileiros. Muitos se recusaram a jogar, e a partida acabou acontecendo de forma improvisada, com 7 jogadores de cada lado. O resultado, que àquela altura era o que menos importava, foi de 3×1 para os hermanos

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1921, a vergonha brasileira

No ano seguinte a Seleção voltaria à Argentina, dessa vez para a disputa do Sul-Americano. Porém, a forma como a delegação brasileira foi recebida no ano anterior levou a Confederação Brasileira de Desportos, a CBD (equivalente à CBF) a pensar em uma medida para conter as “chacotas”. 

O que se viu não foi uma postura contra o racismo, muito pelo contrário. Depois de uma reunião na CBD terminar sem uma decisão final, a questão foi levada ao líder máximo do país, o presidente Epitácio Pessoa, que com a justificativa de “preservar a reputação do país no exterior”, recomendou que a seleção fosse composta apenas por jogadores brancos.

A medida foi amplamente criticada pela mídia brasileira, o Correio da Manhã, de forma precisa, denunciou: 

 ‘O Sacro Colégio de Football (a CBD) reuniu-se em sessão secreta, para decidir se podiam ser levados a Buenos Aires, campeões que tivessem, nas veias, algum bocado de sangue negro — homens de cor, enfim. (…) O conchavo não chegou a um acordo e consultou o papa, no caso, o eminente senhor presidente da República.’ Foi sua resolução de que gente tão ordinária e comprometedora não devia figurar nas exportáveis turmas de jogadores; lá fora, acrescentou, não se precisava saber que tínhamos no Brasil semelhante esterco humano.”

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Entretanto, o presidente não voltou atrás em sua decisão, e o Brasil foi à Argentina sem o seu principal jogador, Arthur Friedenreich, que com 595 gols em 605 jogos, ostenta uma média maior que a de Pelé.

De forma que já era prevista, a seleção não se saiu bem apenas com jogadores brancos: venceu 1 partida e perdeu 2.

Vendo a inferioridade da Seleção, a CBD, em 1922 voltou a convocar jogadores negros. Mas essa medida não foi adotada como forma de combate ao racismo, a volta dos negros se deu unicamente por suas competências técnicas.

Uma seleção composta apenas por jogadores negros não voltou a se repetir, mas o racismo continua presente no futebol de forma contundente. De acordo com Marcelo Carvalho, pesquisador do Observatório de Discriminação Racial no Futebol, dezenas de casos são denunciados diariamente, e o número de punições não chega a cinco.

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